Stefano Chiappalone 14/12/2022
Tradução: Heitor De Paola
Dom Helder Câmara poderá em breve ser declarado venerável. Protagonista da teologia da libertação, simpático à URSS e à China, a luta armada revolucionária foi planejada na sua diocese. Um “midiático e ideológico”, mais do que um santo religioso, diz Julio Loredo, presidente da TFP italiana, ao The Compass.
Houve um passo decisivo na causa da beatificação de Dom Hélder Camara (1909-1999), o “bispo vermelho” brasileiro que em breve poderá ser declarado venerável. O anúncio foi feito pelo arcebispo Fernando Saburido, seu sucessor na arquidiocese de Olinda e Recife, governada por Camara entre 1964 e 1985. Um prelado sui generis, aliou-se à ala mais progressista dos Padres Conciliares e depois, quando o Concílio terminou , ávido por um Vaticano III que superasse o seu antecessor (à esquerda, naturalmente). Protagonista da teologia da libertação, no plano político foi decididamente apoiador das ditaduras comunistas, desde a União Soviética, à China, a Cuba, sempre sob a bandeira da 'defesa dos pobres' com a qual se identificou propagandisticamente em vida e na morte. Se um dia Monsenhor Camara alcançasse a santidade, seria um modelo controverso, para dizer o mínimo. Afirmando isso, e esperando que a causa seja suspensa, está a Tradição, Família e Propriedade (TFP), uma rede de associações nascida no Brasil a partir da obra de Plinio Corrêa de Oliveira (1908-1995), um líder católico, empenhado na 'batalha cultural' por posições opostas às de Dom Câmara. Julio Loredo, presidente da TFP italiana, fala sobre isso ao The Daily Compass.
Loredo: poderíamos ter um 'bispo vermelho' como santo?
Dom Helder Camara foi uma figura-chave do progressismo eclesial desde a década de 1930 até sua morte, um protagonista da virada à esquerda da Ação Católica no Brasil. A teologia da libertação também surgiu como parte deste processo. Além disso, nas décadas de 1950 e 1960, desempenhou um papel central na substituição (geracional, mas também ideológica) do episcopado brasileiro, favorecendo a nomeação de prelados progressistas juntamente com o núncio da época, Dom Armando Lombardi.
Uma parábola que começou, porém, na frente oposta....
E não como um simples militante: foi o número dois do partido pró-nazista Ação Integralista Brasileira, fundado por Plinio Salgado. Quando foi ordenado sacerdote em 1931, vestia sob a batina o uniforme da milícia integralista. Graças a um estudo de Plinio Correa de Oliveira, que mostrou sua incompatibilidade com a doutrina católica, foi retirado o apoio eclesiástico ao movimento, posteriormente proscrito pelo presidente Getúlio Vargas. Após sua dissolução e o exílio de Salgado, Camara iniciou seu deslocamento ideológico à esquerda - que descrevemos no início - para a teologia da libertação e a constituição de Comunidades Eclesiais de Base (CEB), prefigurada pelo pedagogo marxista brasileiro Paulo Freire, inspirador do Movimento de Educação de Base.
Como se comportou Dom Câmara durante o Concílio?
Embora nunca tenha falado na Câmara, ele foi absolutamente central nos bastidores do Vaticano II. Foi ele quem coordenou os encontros entre expoentes da ala progressista (curiosamente, mesmo na frente tradicionalista o impulso veio do Brasil, graças aos encontros coordenados por Plinio Correa de Oliveira, de onde surgiu o Coetus Internationalis Patrum). Durante estes anos, Dom Helder, já parte integrante da teologia da libertação, continuou a sua dissidência com o magistério também no plano moral, incluindo as críticas à Humanae Vitae de Paulo VI e a defesa do aborto.
Um político em vez de um bispo?
Em 1969, fez um famoso discurso em Nova Iorque, no qual apoiou o comunismo internacional. Ele defendeu a URSS e a China de Mao. Um dos episódios mais chocantes remonta a 1968: o documento Comblin. Em junho de 1968, um documento revelou que estava planejada uma revolução comunista armada no Brasil. Joseph Comblin foi um padre belga, professor do Instituto de Teologia do Recife. Portanto, isto ocorreu na diocese e sob a égide de Dom Camara, que não negou a autenticidade do documento, limitando-se a dizer que era oficioso. O projeto previa, por exemplo, a abolição da propriedade privada e das forças armadas; censura à imprensa, rádio e TV; e tribunais populares. Na prática uma revolução bolchevique no Brasil. Correa de Oliveira coletou dois milhões de assinaturas pedindo a intervenção de Paulo VI para bloquear esta infiltração marxista na Igreja brasileira, mas não obteve resposta
Na verdade, o polêmico prelado permaneceu no cargo até a idade canônica de 75 anos.
Em 1984, João Paulo II nomeou seu sucessor José Cardoso Sobrinho, que tentou trazer alguma ordem à diocese, chegando a fechar o Instituto de Teologia e criar outro. No mesmo ano, saiu a instrução do Vaticano Libertatis Nuntius, condenando os aspectos externos da teologia da libertação, mas foi como fechar a porta do estábulo quando o cavalo já fugiu.
E ele pessoalmente nunca retratou suas posições?
Não até onde sabemos. E quando morreu, em Agosto de 1999, desfrutou de uma espécie de canonização mediática. Alguns jornais italianos intitulavam: “Profeta dos pobres”, “Santo das favelas”, “Voz do Terceiro Mundo” e até “Santo Hélder o da América'.
Uma “fama de santidade” ideológica, e não religiosa.
Se Dom Hélder Camara fosse canonizado seria também a canonização do comunismo, da teologia da libertação, da dissidência. Já lhe chamam o ‘Santo dos pobres’, mas ele defendeu regimes que causam pobreza, como resumiu Indro Montanelli: “A esquerda ama tanto os pobres que cada vez que chega ao poder aumenta o seu número”. A respeito da “falsificação da fé cristã” operada pela teologia da libertação, Bento XVI disse que “é preciso opor-se a ela também por amor aos pobres e ao serviço que lhes deve ser prestado”.