Faça a Doutrina Monroe Grande Novamente
Um novo corolário para o mantra "América para os americanos" ou apenas medo da China?
Tradução autorizada pelo Autor: Heitor De Paola
Donald Trump ainda não assumiu o cargo, mas já delineou uma agenda expansionista. Recentemente, ele ameaçou assumir o controle do Canal do Panamá, acusando-o de cobrar preços exorbitantes por navios dos EUA. O meio magnata, meio presidente, também lançou a ideia de renomear o Golfo do México para Golfo dos Estados Unidos.
Em janeiro, Trump também declarou via X (antigo Twitter) seu desejo de anexar o Canadá, enquadrando a fusão como uma solução vantajosa para os canadenses: impostos mais baixos, nenhuma tarifa e uma garantia de que nenhum navio russo ou chinês navegará nas águas canadenses.
Somando-se à especulação, Trump enviou seu filho, Donald Trump Jr., em uma visita informal à Groenlândia, expressando uma disposição de comprá-la da Dinamarca. A Groenlândia, que já abriga postos militares dos EUA, ostenta ricos recursos naturais e potencialmente vastas reservas de petróleo abaixo do leito marinho.
A questão surge naturalmente: o que Trump tem guardado? É uma tentativa de reafirmar a hegemonia dos EUA sobre as Américas, ou é meramente motivada pelo medo da crescente influência comercial da China?
Como os Estados Unidos se tornaram uma potência regional no século XIX
Em 1823, durante a era da Restauração Europeia e após a independência dos países latino-americanos da Espanha, o presidente dos EUA, James Monroe, declarou num discurso histórico que a interferência europeia nas Américas não seria tolerada. Essa "Doutrina Monroe" posicionou os Estados Unidos como guardiões do continente americano.
Em 1845, o jornalista John L. O'Sullivan publicou um ensaio intitulado Annexation, defendendo a adição do Texas aos Estados Unidos. Ele argumentou que a União estava destinada a se expandir para o oeste sob um "Destino Manifesto" para espalhar liberdade, democracia e valores americanos.
Em 1898, os EUA se tornaram mais assertivos no cenário global. Após anos de agitação em Cuba, a explosão do USS Maine se tornou o casus belli para a guerra com a Espanha. Os Estados Unidos invadiram e anexaram Porto Rico e derrotaram a Espanha em Cuba, efetivamente encerrando a presença colonial espanhola nas Américas.
Em 1904, o presidente Theodore Roosevelt expandiu a Doutrina Monroe com o Corolário Roosevelt, pedindo a criação de um "Poder Policial Internacional" para lidar com a insolvência das chamadas "nações atrasadas". Isso foi em parte em resposta às ameaças europeias de intervir militarmente na Venezuela por dívidas não pagas.
A importância estratégica da Groenlândia
Trump atraiu a atenção internacional para a Groenlândia ao expressar interesse em adquiri-la, citando preocupações com a segurança nacional. A Groenlândia já abriga a Base Aérea de Thule, um local crítico para sistemas de defesa de mísseis e radar avançado para o Comando de Defesa Aeroespacial da América do Norte (NORAD).
Além de sua importância militar, a Groenlândia tem uma estimativa de 2,5 milhões de toneladas métricas de reservas de terras raras, bem como depósitos de ferro, ouro, cobre, urânio e zinco. Geólogos também estimam que a região do Ártico poderia conter 90 bilhões de barris de petróleo, 669 trilhões de pés cúbicos de gás natural e 44 bilhões de barris de líquidos de gás natural.
Tanto a Rússia quanto a China aumentaram sua presença no Ártico, envolvendo-se na pesca e outras atividades. O derretimento das geleiras abriu novas rotas comerciais, intensificando a competição geopolítica entre essas nações e os EUA.
O Ministro das Relações Exteriores da Dinamarca, Lars Løkke Rasmussen, expressou abertura para trabalhar com os EUA, enfatizando a necessidade de combater a China e a Rússia no Ártico. Enquanto isso, o Primeiro Ministro da Groenlândia, Múte Bourup Egede, indicou disposição para discutir o assunto com os EUA, ao mesmo tempo em que afirmou a aspiração da Groenlândia por independência total da Dinamarca.
A presença chinesa na América Latina
A influência da China não se limita ao Ártico. Na América Latina, os investimentos chineses aumentaram, com projetos incluindo minas, instalações de extração de petróleo, canais, portos e infraestrutura.
Pequim assinou acordos de cooperação com Cuba, fortaleceu laços com a Venezuela e financiou a construção de barragens na Argentina. No Brasil, investimentos significativos foram canalizados para a empresa nacional de petróleo, Petrobras.
Um dos exemplos mais marcantes é a construção do Canal da Nicarágua, um projeto apoiado pela China que visa rivalizar com o Canal do Panamá, controlado pelos EUA.
A crescente presença da China nas Américas é reforçada por sua participação no BRICS (junto com o Brasil), abrindo caminho para uma sólida parceria comercial anti-EUA na região.
A intensificação das atividades chinesas nas Américas é uma continuação das tensões comerciais entre a China e os Estados Unidos que começaram durante a primeira administração de Trump. Essas hostilidades, que aumentaram em março de 2018 com os EUA impondo tarifas de 25% sobre produtos chineses, foram enquadradas como uma resposta ao suposto roubo de propriedade intelectual chinês e transferências forçadas de tecnologia.
Em janeiro de 2020, na véspera do surto de COVID-19, os EUA removeram a China de sua lista negra de manipuladores de moeda e assinaram um acordo comercial para acalmar o conflito econômico.
Em um mundo cada vez mais multipolar, as Américas, por suas commodities suculentas, estão se tornando o novo ponto focal de um novo tabuleiro de xadrez geopolítico. Entre as ambições de Trump e a China ganhando força, o futuro da região permanece incerto.
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