QUEM TEM MEDO DE DUGIN?
Meu objetivo neste artigo é investigar, ainda que superficialmente – para análise mais profunda seria necessário um livro – a relação entre Vladimir Putin e Alieksandr Dugin
Heitor De Paola 14/03/2024
A Rússia é de fato uma velha casa asiática com uma varanda rasgada sobre a Europa...Um pouco do ar da Europa penetra então pela varanda levando o rumor de nossas ideias, de nossas inovações morais. Mas é um ar que mal passa das grades. E quando as portas da varanda se fecham, só há dentro um oriente antigo e muito estranho, que nós não podemos compreender.
EÇA DE QUEIROZ Ecos do Mundo, 1880
A interpretação usual entre nós é que Putin segue Dugin que seria o ideólogo oficial do regime autoritário, eurasiano e multipolar de Putin. Pois, na minha opinião, a verdade é o oposto: quem dá as cartas e comanda o espetáculo é Putin, que utiliza Dugin como seu mastim ameaçador. Sabem aquelas placas que existem em casa com cães ferozes “cuidado com o cão”? Pois é: cuidado com Dugin, é perigoso. Não nego que Dugin seja muito perigoso, não por influência sobre Putin, mas sim pela propagação e repercussão de suas delirantes ideias em todo o mundo, o que obviamente encanta Putin pois são propagandas russas para mentes igualmente delirantes, pois para quem consegue pensar claramente são puros delírios. Por isso alguns setores ocidentais têm dado mais atenção ao perigo de Dugin do que o real e efetivo perigo do próprio Putin. Isto é o que ocorre principalmente nas chamadas mídias sociais, mas não nas análises sérias de comentarista internacionais com maior aprofundamento, onde mais se fala dele do que do suposto ideólogo.
Vejamos alguns exemplos:
Recentemente o site DEFESANET publicou um artigo intitulado Urgente – Rússia via Alexander Dugin, confirma confronto Global no qual manifesta o “real” perigo destacado pelo “filósofo e geopolítico” Alieksandr Dugin que em sua estridência e tom alarmista habitual desfila ameaças de um conflito mundial que já estaria em andamento através das guerras da Ucrânia, do Oriente Médio, as ameaças de Maduro de anexar Essequibo à Venezuela, e ainda acrescenta o caso das Ilhas Falklands – provocativamente chamadas Malvinas – e o conflito China/Taiwan. Muito mais é dito como é do seu feitio apocalíptico. Em 19/10/23 um documento do Departamento De Estado, Relatório especial do GEC (Global Engagement Center) Exportando desinformação em favor do Kremlin: o caso da Nova Resistência no Brasil alertava que “o Kremlin usa tanto redes abertas como ocultas para manipular informação e disseminar ideologias antidemocráticas e autoritárias ao redor do mundo”. Cita a Rede de Sincrética de Desinformação (SDN), que inclui o movimento Nova Resistência no Brasil, o portal de notícias Fort Russ News (FRN) e o Centro para Estudos Sincréticos (CSS). Em 7/11 o mesmo Departamento publicou um comunicado de imprensa, The Kremlin’s Efforts to Covertly Spread Disinformation in Latin America, que inicia com a seguinte observação: “o governo russo está atualmente financiando uma campanha de desinformação contínua e bem financiada em toda a América Latina” e termina dizendo que a desinformação é para minar o apoio à Ucrânia e propagar medidas anti-EUA e sentimento anti-OTAN”.
Investiguei as três organizações citadas e pertencem realmente a um apparat de propaganda e desinformação russas e ainda descobri um jornal norueguês dedicado a investigar a censura à imprensa independente na Rússia: The Barents Observer editado em Kirkenes, Noruega, em russo com versões em inglês e mandarim.
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Eu não tinha ideia da penetração das ideias delirantes de Dugin aqui no Brasil e, de resto, em toda Iberoamérica até ter sido avisado por amigos já em dezembro passado. Como eu já conheço as ideias de Dugin dediquei-me a aprofundar nessa penetração.
DUGIN COMO IDEÓLOGO
Dugin tem um bom livro sobre geopolítica, Foundations of Geopolitics: The Geopolitical Future of Russia, excelente como resenha dos conhecimentos atuais sobre o tema, mas falho quando pretende inovar, pois as ideias que expõe não são novas. Os primeiros dez capítulos (Parte I) – Founding Fathers of Geopolitics – e os seis da Parte II – Modern Geopolical Theories and Schools - são muito bons para quem quer se aventurar a entender as ideias básicas sobre o assunto e se aprofundar posteriormente. Alguns pensam que sistematiza e detalha os fundamentos da geopolítica como ciência, sua teoria e história. Cobrindo uma ampla gama de escolas e crenças geopolíticas e problemas reais. A Amazon afirma que é a primeira vez que surge uma doutrina geopolítica russa. Claro que a empresa está interessada em propagandear o seu produto, mas....
O que fizeram os Imperadores russos até então? E os comunistas? Nada? Sentaram no Palácio de Inverno ou no Kremlin e ficaram observado as nuvens? É só ler as biografias de Pedro, o Grande (Tsar da Rússia 1682-1721 e Imperador de todas as Rússias de 1721-1725) e Catarina II, a Grande (Imperatriz 1762-1796) e veremos que possuíam uma visão bem clara do seu império e pode-se afirmar que essas eram visões geopolíticas, pois utilizavam a geo-grafia para exercer seus poderes políticos, como, p. ex., Catarina numa frase: como não posso defender a fronteira ocidental e os países que nos ameaçam, só me resta invadi-los. No final do reinado de Catarina, a Rússia tinha-se expandido para oeste e para o sul numa área de mais de 320.000 km2, conquistando a Crimeia do Império Otomano, várias extensões no Cáucaso e pontos estrategicamente sensíveis no Ocidente. A derrota dos turcos e a conquista da Crimeia foi obra do grande estrategista Grigory Potemkin, que com isto conquistou também o leito da sexualmente irrefreável Imperatriz. Desnecessário falar das ações do regime soviético, bastante conhecido.
Agora pergunto: geopolítica é ciência? A palavra ciência perdeu todo o sentido quando foi transportada do estudo da natureza para áreas relativas às sociedades, política, culturas, psicologia, história, etc., de modo que hoje tudo pode ser “científico”, basta alguém com força suficiente para impor à vontade seus dogmas através do siga a ciência! e impedir todas as ideias que a contrariem. Esta barafunda é o corolário da afirmação de Karl Marx de que seu socialismo é científico e todos os anteriores não o são, da mesma forma que sua absurda versão da história – que parte de corrupção das estatísticas - é baseada na dialética “científica” que superou a de Hegel. Além disto como pode haver ciência em Dugin se o subtítulo indica uma clara visão estratégica sobre o futuro geopolítico da Rússia? Ciência se aplica igualmente em qualquer lugar do mundo, é absoluta, nada tem a ver com sociedade, cultura e o que mais. Mas há grande vantagem de relativizar a ciência: se tudo é ciência, cada um pode ter a sua ciência particular. Enquanto a verdadeira ciência é distorcido e ideologizada, como ocorreu com a teoria da relatividade que não penetrou na União Soviética enquanto a oposição de Beria (chefe da NKVD, posteriormente KGB) impediu, pois contraria a visão idiotizada do pseudo pensamento dialético. Hoje em muitas partes entende-se ciência como o produto da supremacia branca, uma idiotice igual. A geopolítica não é uma ciência porque não existem leis absolutas nesta área. A ciência estudas as leis da natureza que não podem ser revogadas nem emendadas como as leis comuns. Um criminoso pode ser absolvido, mas se tentar voar, cai e morre! Dado o estado atual de mistificações nesta área nunca é demais repetir: a ciência não tem “leis científicas”, as leis que as ciências estudam são leis da natureza, as Leis do Criador do que chamamos natureza. Não precisam ser ou não seguidas porque são absolutas, não podem ser burladas! O fato é que geopolítica é um estudo importante, fascinante e necessário. Insistir que seja ciência é puramente um desejo de poder impor aos demais as conclusões a que se chega com ela, o siga a ciência! tão moderno e, como já vimos e fomos afetados há poucos anos, uma farsa porque ciência nada tem a impor! A natureza, sim: Deus põe, dispõe e impõe.
Segundo a introdução ao referido livro de Dugin, escrito pelos editores da versão em Inglês: ‘......a geopolítica até agora não conseguiu entrar na categoria das ciências convencionais. Os postulados originais do dualismo geopolítico, competição de estratégias, civilização, diferenciação, etc. são [hoje] ignorados, encobertos ou totalmente negados. É difícil imaginar algo semelhante em qualquer ciência. O que aconteceria com a física clássica se, operando com os conceitos de “massa”, “energia”, “aceleração”, etc., os cientistas começassem a negar implícita e gradualmente a lei da gravitação universal, esquece-la e simplesmente falar de Newton como uma “figura mitológica que não existiu na realidade” ou um “obscuro fanático religioso”. Mas é isso, mutatis mutandis, o que acontece com a geopolítica nos dias de hoje.
A comunidade científica os rejeita teimosamente em seu ambiente, criticando duramente e, na maioria das vezes, os ignora, enquanto as autoridades, usam ativamente conceitos geopolíticos para formular estratégias. Foi o caso, por exemplo, de um dos primeiros geopolíticos, Sir Halford John Mackinder, o verdadeiro fundador da disciplina. Suas ideias não foram aceitas nos círculos acadêmicos, mas ele próprio esteve diretamente envolvido em moldar a política britânica na primeira metade do século XX, estabelecendo as bases e a fundamentação teórica para a estratégia internacional da Inglaterra, assumida pelos Estados Unidos em meados do século e desenvolvido pelos seus seguidores americanos, os chamados atlanticistas.
O Tratado de Versalhes, por exemplo, foi o trabalho da escola geopolítica de Mackinder, expressando interesses ocidentais e com o objetivo de enfraquecer os estados da Europa Central e suprimir a Alemanha. O discípulo alemão de Mackinder, Karl Haushofer, com base nas mesmas premissas, desenvolveu a teoria exatamente oposta de “libertação da Europa”, o que foi uma negação completa da lógica de Versalhes e formou a base da ideologia do nascente nacional-socialismo’.
Mackinder em seu brilhante The Geographical Pivot of History, artigo submetido em 1904 à Royal Geographical Society avança sua teoria do “coração do mundo” (Heartland), a Eurasia. Neste artigo, Mackinder, que era geógrafo, ampliou o escopo da análise geopolítica para abranger todo o globo. Dele procede a ideia de Dugin a sobre Eurasia, a Grã Rússia e sobre Talassocracias – nações que dominam os mares - e Telurocracias - nações que possuem um território-estado definido no qual vive a maioria étnica formadora do estado; em torno deste território ocorre uma maior expansão territorial.
As partes III a V definem a estratégia da Rússia segundo Dugin. São importantes para entender o que ele pretende embora me pareçam carregadas de misticismo que eleva a Rússia – acho que no original em russo ele se refere à Ródina (Родина) a Pátria-Mãe – carregada de crenças místicas que transformam um bando de bárbaros dos Urais no supra-sumo da divindade. Mas não há espaço suficiente aqui para abordá-las.
Mesmo a ideia de multipolaridade não é originalmente sua: as organizações globalistas a utilizam como objetivo há cem anos, como o Council of Foreign Relations (ver aqui). A fundação da ONU, da OMS, da UNESCO, o World Economic Forum e a miríade de ONGs globalistas nada devem ideologicamente a Dugin.
DUGIN COMO FILÓSOFO
Dou tratos à bola para tentar entender porque Dugin é chamado de filósofo. Qual sua filosofia? Quais os pontos básicos de seu pensamento? Tenho estudado suas obras e de seus seguidores e só consigo perceber pontos de vista estratégicos ou quando muito geopolíticos. Claro que há uma base para seus conhecimentos estratégicos, mas não passa de uma ideologia, jamais uma filosofia!
Suponho que suas teses sobre Noomaquia divulgadas pela Nova Resistência sejam consideradas altamente filosóficas. Não obstante, ele refere que sua base é a “Noologia como ciência da multiplicidade do pensamento humano” e defende a relatividade do pensar dando um interesse maior à “cultura” que determinaria o modo de pensar: “A noologia constitui a base metafísica de tudo isso. Ao tratar outros povos de maneira diferente de nós, como se fossem “inferiores”, nada fazemos além de projetar nossa abordagem racista estabelecendo uma igualdade entre nós e a norma universal, igualdade que é ilegítima e, acima de tudo, falsa, por trás do que é uma pura luta colonial pelo poder”. Parece a mim que esta ideia de noologia deriva das teses não menos delirantes do antropólogo jesuíta Teilhard de Chardin sobre a noosfera , a “camada pensante que se expande por cima do mundo da plantas e do animais: fora e acima da biosfera” (O Fenômeno Humano). Nota-se aqui que Dugin nada tem de filósofo, é apenas um politicólogo, o que fica evidenciado por sua Quarta Teoria Política que visa a superação das teorias políticas da modernidade: o liberalismo, o comunismo e o fascismo. Esta quarta teoria é baseada na superioridade filosófica e espiritual da Rússia como criadora/depositária dos verdadeiros fundamentos de valores que foram, na verdade, criados no Ocidente e em função do liberalismo tão odiado por eles e seus seguidores.
Não consigo entender como se constrói uma filosofia desta forma. Uma filosofia é estudar como o mundo é, e não como gostaríamos que fosse.
A HEPTARQUIA – OS SETE IMPÉRIOS EM FORMAÇÃO SEGUNDO DUGIN
Para quem conhece a história da Idade Média esta palavra soa como uma imitação ou paródia do que aconteceu na Grã Bretanha quando da invasão anglo-saxônica no século VI DC. Divididos, os invasores formaram sete reinos.
A ideia de Dugin é baseada numa única premissa: a de que até o momento o mundo está sob o Império Americano, unipolar portanto, mas sete outros impérios estariam emergindo para a existência de um mundo multipolar. Vejamos os sete impérios:
1. Império Ocidental (EUA + UE + vassalos e vassalos menores).
2. Império Eurasiático (Rússia + espaço pós-soviético, aconteça o que acontecer).
3. Império Chinês (China continental + Taiwan e vários estados gravitando em torno da China a partir da iniciativa ‘Um Cinturão, Uma Rota’).
4. Império Indiano (Bharat + Nepal + Bangladesh + nações do Sudeste Asiático inclinadas para a Índia).
5. Império Islâmico (um bloco potencial de países islâmicos com polos principais sendo a Arábia Saudita + países árabes sunitas, Irã xiita, Paquistão, Turquia, Indonésia, países do Magreb e outros).
6. Império Latino-Americano (baseado na união do Brasil e da Argentina com a adição de outros países, até as nações caribenhas e o México).
7. Império Africano (império do planalto Manden em torno de Mali + ecúmeno Bantu central e meridional + Etiópia e o mundo Cushítico).
Retirei esse esquema do artigo de Luís Nassif por ser mais acessível do que a obra de Dugin citada, Os sete impérios em formação, segundo Alexander Dugin no qual tece considerações sobre a obra de Dugin, mas deixa claro que são apenas elucubrações, i. é., parece que estão se formando..... Ora, como é que se pode fundar alguma coisa sobre nuvens que mudam com a direção do vento? Vejamos:
1. O Latino-Americano já furou, Milei não quer saber nem de entrar para os BRICS, e sua visão socioeconômica difere radicalmente de toda essa agenda. Bukele nem deve saber do que se trata.
2. O Eurasiano, que Putin já chamou de nossa civilização estatal emergente no think tank russo Valdai Club em 2004: o espaço pós soviético aconteça o que acontecer - já aconteceu, a OTAN planeja incluir esse espaço na sua estratégia, começando pela Georgia, Bosnia-Herzegovina e continua antevendo a antrada da Ucrânia.
3. O Chinês: Dugin parece desconhecer, ou desdenhar, o fato de que a China ainda seria um país paupérrimo se não fosse a armadilha criada por Deng Xiaoping e a burrada do Ocidente que caiu nela e fez a China crescer exatamente pela entrada da economia de mercado que ele tanto abomina. Só depois este maná está acabando pelo controle estatal asfixiante. Mas que por isto mesmo a economia vem encolhendo e a miséria retornando.
4.O Islâmico: Dugin pretende pacificar sunitas e shi’itas, salafistas e alawitas e todos esses com os liberais, cujas divergências religiosas são enormes? Qual país ficará no comando: Arábia Saudita ou Irã? E com sede no Iraque (Bagdad, centro do Grande Califado Abássida)? Vão decidir pacificamente no par ou ímpar?
Estamos frente a um exemplo significativo de ideologia, tal como a define Eugênio Capozzi:
A marca inequívoca de qualquer ideologia é a sua oposição direta à realidade concreta, a sua construção de um mundo imaginário, abstrato e alienado, no qual a sociedade é completamente desmantelada e reconstruída de acordo com o lúcido delírio pseudo-religioso e científico que visa construir o “novo homem” imune a falhas e conflitos, “forçado” à felicidade. Uma realidade artificial e alternativa que inevitavelmente, quando os defensores dessa ideologia ganham total poder e tentam fazê-la funcionar, assume a forma de uma distopia: não o paraíso, mas o inferno na terra, uma prisão, um asilo e um lugar de tortura para as sociedades infelizes condenadas a sofrê-lo. (ênfase minha).
As ideias de Dugin devem ser confrontadas, portanto, com as de Klaus Schwab e seus discípulos, pois se equivalem. Isto não quer dizer que não sejam perigosas, pois ambas são projetos de Governo Mundial Totalitário.....ou sete?
A PRETENSA INFLUÊNCIA SOBRE PUTIN
Minha impressão é de que Dugin, sem negar sua enorme erudição, é um sujeito delirante, metido a onipotente e onisciente e com um tom profético que muito me lembra Rasputin, só que sem uma Tzarina histérica nem um Tzarievitch doente, mas sua tão alentada influência seria sobre Vladímir Putin, um tchekista (apesar das várias mudanças de nome os membros do KGB são assim tratados em honra à Tcheka, primeira polícia política soviética) que nada tem de histérico, mas em quem predomina a frieza que não lhe era natural - desde jovem era um brigão de primeira, um rufião como ele mesmo se identifica - foi duramente aprendida durante sua estadia em Dresden nos tempos da guerra fria com o reconhecidamente maior espião do século XX, Markus Wolf, the man without a face, Diretor do Diretório Central de Reconhecimento do Ministério para a Segurança do Estado - Ministerium für Staatsicherheit – MfS, mais conhecido como STASI e chefe do Departamento Exterior (STASI-Ausland). O estabelecimento deste Departamento em Dresden foi uma ideia genial de Wolf: Berlin estava infestada de espiões ocidentais e Dresden era uma cidade pacata em reconstrução após os ataques aéreos britânicos, e ninguém prestava atenção. Enquanto Wolf comandava a infiltração no governo da Alemanha Ocidental, Putin comandava todos os movimentos terroristas, principalmente os voltados contra a Alemanha Ocidental, como Baader Meinhoff, mas também os muçulmanos e latino-americanos. É possível que Putin tenha não só coordenado e dado aulas, mas também tenha aprendido muito com os terroristas, como p. ex., saber usar dispositivos radioativos, como o Polônio, para matar opositores.
Putin é comunista? Putin é KGB. A maioria das pessoas acredita que KGB=comunista, mas não é bem assim. Lenin deu enormes poderes ao Diretor da Tcheka, o Conde polonês Féliks Dzerzhinsky, a tal ponto que este já como que adivinhava o que Lenin queria e agia por conta própria. Na Guerra Civil (1917-23) a Tcheka assumiu papel importante e criou ainda mais poder através de sua seção militar. Foram criados os Comissários em todas as unidades do Exército Vermelho.
Embora o nome tenha mudado várias vezes a polícia secreta sempre teve uma grande força dentro dos governos russos desde os tempos do Império e a incrementaram nos tempos soviéticos O poder é derivado em grande parte pela chantagem possível pela investigação constante de todos os membros do partido e do Estado Soviético. Dzerzhinsky permaneceu Diretor até sua morte por causas naturais – uma raridade! - em 1926. Com a “abertura democrática” da Perestroika, mudou outra vez de nome: FSB, mas continua a mesma e ainda mais forte, tendo inclusive aumentado o número de agentes em relação à população. Porém, agia até há pouco com luvas de pelica, sem a antiga truculência. Esta retornou com a queda da popularidade de Putin. Grande parte de seus “ex” agentes enriqueceu através de chantagens formando a chamada “máfia russa”, enquanto outros se dedicaram a enriquecer mais ou menos lgalmente formando a oligarquia.
Durante o domínio de Stalin (1924-53) que via em todos um perigoso inimigo foram oito Diretores, sendo Yágoda e Yézhov que comandaram os “Julgamentos de Moscou” e depois foram acusados de traidores trotskystas, submetidos aos mesmos “julgamentos” e executados, sendo substituídos por Lavrentii Beria que comandou a polícia (1938-53) intermitentemente e tentou assumir o poder com a morte de Stalin. Um ano depois o nome mudou para KGB. Sob Yuri Andropov (1967-1982) o KGB aumentou imensamente seu poder, principalmente após o AVC de Brezhnev em 1975 quando Andropov assumiu de facto o poder através dos Ministros da Defesa e das Relações Exteriores. Com a morte de Brezhnev em 1982, Andropov assumiu a liderança política. Finalmente o KGB estava no poder.
Foi o KGB, dirgido por Vladímir Kryuchkov (1988-1991) que comandou as farsas chamadas perestroika e glasnost. Gorbachëv foi escolhido ainda em vida por Andropov e Putin foi preparado para ascender ao trono da “nova Rússia” federal e democrática. Yeltsin, que era legitimamente democrata, foi enganado e pediu publicamente os votos para Putin, que é homem do sistema, que não mudou em nada, apenas se livrou das amarras ideológicas do marxismo-leninismo. Há muito que os aparatchiks do partido abandonaram qualquer ideologia que só serve para enganar e seduzir os idiotas úteis! (ver meu livro O Eixo do Mal Latino-Americano). Os chamados oligarcas, também ex membros do KGB, que proliferaram durante o governo Yeltsin, foram acomodados por Putin que lhes ofereceu um acordo: cedam à minha autoridade, fiquem fora do meu caminho, e vocês poderão manter suas mansões, super iates, jatos particulares e corporações multibilionárias (corporações que, apenas alguns anos antes, eram propriedade do governo russo). Está no poder desde 2000 como Presidente e uma gestão como Primeiro Ministro de seu ex Primeiro Ministro, cercou-se de uma guarda estilo pretoriana, as forças de segurança, os siloviki [силовики], literalmente: homens fortes. Cabe aqui citar novamente Eça de Queiroz falando sobre o Tzar Alexandre III: “Ora, o Czar é um autocrata onipotente sem igual na história, pelo menos na história da Europa civilizada. Mesmo nas grandes civilizações asiáticas, os soberanos não dispõem de um poder tão incircunscrito” (ilimitado). Parece que a Rússia nada mudou desde os tempos imperiais. E Putin continua em Moscou seu trabalho em Dresden ao apoiar o Hamas (aqui) e, mais recentemente, por receber Hmas, Hezbollah, Autoridade Palestina e outras organizações terroristas em Moscou para elaborar uma estratégia de reconhecimento de um estado palestino para impedir a total destruição do Hamas pelas Forças de Defesa de Israel. Seu poder é bem definido pelo artigo Repression by Law, de Atle Staalesen encontrado através do referido Barents Observer. Este artigo, de fácil acesso em .pdf gratuito, mostra a existência do regulador de mídia Roskomnadzor que emitiu no início de 2021 regras mais rígidas sobre o comportamento de jornalistas em comícios.
Putin nada mais faz do que aplicar a lei....que ele mesmo criou e foi aprovada pela submissa Duma (Parlamento). Tem um controle rígido da imprensa e investe em “conteúdos estatais” online destinados aos jovens através de mídias estatais. Segundo o Barents o governo russo investiu em 2021 10 bilhões de rublos na produção de “conteúdos espirituais e morais” online destinados aos jovens (aqui e aqui).
Mas seu tão propalado poder autocrático anda cambaleando como resultado de sua política de divide et impera e aos protestos contra eliminação de eventuais opositores capazes de ganhar as eleições presidenciais dos próximos dias 15 a 17 de março. Segundo a Foreign Affairs (revista to Council on Foreign Relations) essas servirão apenas “para renovar o poder do presidente russo. Nunca houve dúvidas reais sobre o resultado, que marcará o seu quinto mandato. Mas o Kremlin tomou medidas extraordinárias para garantir isso: em 8 de fevereiro, a Comissão Eleitoral Central anunciou que o candidato antiguerra Boris Nadezhdin foi desqualificado para concorrer. Oito dias depois, Alexei Navalny morreu numa colônia prisional do Ártico, um acontecimento amplamente atribuído ao Estado russo, que eliminou o líder da oposição mais proeminente da Rússia. Navalny não concorre às eleições, mas a política russa tinha sido até recentemente reduzida a um confronto Navalny-Putin. Agora Putin está sozinho no Olimpo político. Com figuras como Navalny e Nadezhdin fora do caminho, a votação pode proporcionar uma afirmação retumbante de Putin”. Finalmente Leonid Volkov, um crítico ferrenho de Putin e Chefe de Gabinete de Aleksiei Navalny, foi atacado em Vilnius, Lituânia, dia 12/03 com um martelo e gás lacrimogêneo, teve um braço quebrado e várias outras contusões. Essas “mortes por causas naturais” estão corroendo a popularidade de Putin.
Some-se a economia que não vai nada bem. Gastos militares elevadíssimos, podendo chegar a 25% do orçamento, diminuição das exportações por causa do fechamento dos mercados ocidentais, a diminuição do número de jovens e a ausência de produção dos enviados para a guerra junto com o aumento do número de idosos, indica que o rendimento do trabalho está caindo drasticamente. Além de tudo Putin travou as reformas econômica iniciadas por Yeltsin e brevemente retomadas por Medvedev. Em 2016 o ex-ministro das Finanças, Alexei Kudrin recomeçou as mudanças estes esforços foram frustrados pela falta de vontade política, e tornou-se claro que “qualquer tentativa de modernização autoritária terminaria simplesmente em autoritarismo – sem a modernização” (idem). Nós conhecemos bem esta modernização baseada em investimento estatal. Mas este é Putin, o homem que quer controlar tudo.
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Reconhecer que Putin é um tirano e não tem relações de subordinação, com Dugin, não significa negar tudo que já escrevi sobre a guerra na Ucrânia como motivada pela expansão da OTAN e deixo aqui a observação de Os fundamentos intelectuais do MAGA, de Edward Ring:
“Para qualquer pessoa ligeiramente familiarizada com os últimos cinquenta anos de história europeia, esta observação é uma propaganda flagrantemente enganosa. Em 1989, à beira da sua dissolução pacífica, a União Soviética ainda controlava o que era conhecido como Pacto de Varsóvia, e as fronteiras da Europa Central da OTAN paravam na fronteira oriental da Alemanha Ocidental e da Áustria. A Iugoslávia e a Finlândia eram neutras. Desde então, a OTAN expandiu-se para leste para incluir a Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia, República Checa, Eslováquia, Romenia, Bulgária, partes da antiga Iugoslávia e Alemanha Oriental (reunificada com a Alemanha), [Finlândia, Suécia] [além de dominar a União Europeia]. A Ucrânia, que poderia ter permanecido neutra, nunca esteve “à porta da OTAN”. A soleira da porta foi movida para o leste. Reconhecer isto não equivale a russofilia. Mas é um facto pertinente que pertence hoje a qualquer discussão honesta sobre a guerra ali”. (ênfases minhas)